Caso Joyce: processo segue em sigilo e família busca por justiça 1 ano após morte de mulher no AC
17/11/2025
(Foto: Reprodução) Caso Joyce: audiência pública discute situação alarmante de feminicídios no Acre
"Estamos aprendendo a conviver com a falta dela"
Um ano após a morte da acreana Joycilene Sousa de Araújo, de 41 anos, a família da gerente segue em busca por justiça ao passo que lida com o luto. O caso segue em segredo de justiça e, segundo a irmã, Jaqueline Sousa, a luta é para que Joyce 'não seja uma mera estatística de morte autoprovocada'.
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👉 Contexto: A família de Joyce, como era conhecida, acusa o então namorado dela, Thiago Augusto Sampaio Borges, de indução ao suicídio, violência psicológica e patrimonial, estimada em R$ 200 mil. A acreana morreu no dia 17 de novembro, no Instituto de Traumatologia e Ortopedia do Acre (Into-AC), em decorrência de uma parada cardíaca causada pela ingestão de comprimidos de uso controlado, uma semana antes. O g1 chegou a conversar com Thiago, com exclusividade, e ele disse que foi alvo de calúnia e difamação. Depois, desativou as redes sociais. Relembre aqui.
A reportagem também entrou em contato com a Polícia Civil para saber o status da investigação. No entanto, como o caso corre em segredo de justiça, o órgão não confirmou quais hipóteses estão sendo apuradas.
Nesta segunda (17), dia em que o caso completa um ano, a família organiza uma missa em homenagem a Joyce. O ato religioso é aberto ao público e ocorre na Catedral Nossa Senhora de Nazaré, no Centro da capital acreana.
"Esperamos que a sociedade não se esqueça da Joyce, que a história dela continue sendo contada, não apenas como uma vítima, mas como a pessoa cheia de vida que ela era. Que mudanças aconteçam na sociedade e na legislação para que outras famílias não passem pelo que estamos passando", complementou.
EXCLUSIVO: Polícia investiga namorado por morte de mulher no Acre; família acusa homem de violência patrimonial e psicológica
Jaqueline Sousa (irmã) e Eduarda Cavalcante (filha) acusam namorado de Joyce Sousa de violência patrimonial e abusos psicológicos que culminaram na morte da gerente acreana no dia 17 de novembro
Renato Menezes/g1
O caso
Joycilene Sousa de Araújo morreu no dia 17 de novembro de 2024 após uma parada cardíaca decorrente de uma tentativa de suicídio uma semana antes. Antes da morte dela, mesmo ainda mantendo contato com Thiago, Joyce estava decidida a pedir uma medida protetiva contra ele e tentar reaver o carro que estava sob posse dele.
Na madrugada do dia 11 daquele mês, por volta das 2h, Joyce se dirigiu até a Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam) para fazer o pedido da medida e poder dar entrada no pedido de devolução do veículo.
“Já na segunda-feira de manhã [11 de novembro], ela, minha tia e o advogado fizeram uma reunião e ela estava bem. Ela acordou, tomou banho, arrumou o cabelo, fez uma maquiagem [...] ela pegou o prontuário para anexar com o advogado e estava feliz porque ela iria pegar o carro justamente porque estava difícil de ele devolver. Ele queria continuar com o carro, mas estava com duas parcelas em aberto e o nome dela sujo”, falou na época a filha de Joyce, Eduarda Cavalcante.
Após a repercussão do caso, Thiago teve o celular e o carro apreendidos pela Polícia Civil de Minas Gerais (PC-MG) no dia 13 de dezembro. Na ocasião, ele também chegou a ser preso por desobediência e por apresentar falsa identificação, mas foi liberado horas depois. O cumprimento do mandado de busca e apreensão ocorreu em Itabira (MG), cidade natal dele.
O carro apreendido, avaliado em R$ 100 mil, foi retirado em Belo Horizonte (MG). Segundo a família, ele deu a ideia de comprar o veículo no nome dela, já que ele supostamente recebe um benefício do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) por burnout, e isto impossibilitaria de colocar a despesa no nome dele. O boleto veio para Rio Branco.
Joycilene Sousa de Araújo tinha 41 anos, era gerente e morreu após uma parada cardíaca, sete dias após uma tentativa de suicídio em Rio Branco
Arquivo pessoal
Thiago é de Minas Gerais, tem 43 anos e se descreve como engenheiro civil e analista administrativo. Em entrevista exclusiva ao g1 na época, Jaqueline Sousa e Eduarda Cavalcante explicaram detalhes da relação conturbada de quase 10 meses entre a gerente e o suspeito, que elas consideram abusivas, bem como sobre a campanha em busca de respostas e celeridade ao caso.
“Eram informações que ele foi colhendo, e foram muitas em 10 meses de relação [...] e aí depois ele foi já usou outra estratégia, dizendo ‘eu vou cuidar de você, nós vamos casar, eu vou cuidar da sua filha, nós vamos morar aqui perto do João Vitor [outro filho dela]. Eu vou te fazer feliz, grave isso. Eu nunca vou soltar a sua mão’. Essa era a frase que encantou a minha irmã porque ele dizia assim: ‘aconteça o que acontecer, mas eu nunca vou soltar a sua mão’, e ela foi se encantando e foi ficando mais apaixonada”, relembrou Jaqueline.
O g1 fez uma consulta no sistema do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJ-RN) e constatou que há três registros de processos no nome dele:
Inquérito policial de violência psicológica contra mulher, datado de 19 de agosto de 2022 e registrado na Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher de Natal (RN), arquivado em 2 de março de 2023;
Petição criminal de vias de fato, datado de 1º de dezembro de 2022;
Ação penal de procedimento sumaríssimo [para agilizar processo] por ameaça, datado de 20 de julho de 2023.
Nesta foto, Thiago Augusto Borges foi filmado por Joyce Sousa após ter sido flagrado supostamente usando drogas dentro da casa dela, em Rio Branco
Cedida ao g1
Já no Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG) constam seis processos, sendo cinco cíveis já arquivados, e um criminal, referente ao Tribunal de Justiça do Acre (TJ-AC).
A irmã relata ainda que as torturas psicológicas foram se tornando frequentes. No entanto, ninguém da família sabia ao certo o que se passava entre os dois, já que ela dizia que Thiago era um homem rico.
“Ela estava com uma estafa [fadiga] física e mental porque ela não conseguia mais trabalhar. Ele a perseguia 24 horas, tinha vezes que ele tinha brigas surreais com ela que ela se levantava da cama, ia para o quarto da minha mãe e dizia assim: ‘mãe, eu não aguento mais, eu quero morrer’. Aí abraçava e ficava deitada com a mãe”, disse.
Joyce Sousa de Araújo tinha 41 anos, era gerente e morreu após uma parada cardíaca, sete dias após uma tentativa de suicídio em Rio Branco
Arquivo pessoal
Thiago veio ao Acre duas vezes: em maio, quando conheceu Joyce presencialmente; e no final de setembro para início de outubro, quando ocorreu os supostos episódios de importunação sexual contra a filha de Joyce, no dia 4, e uso de cocaína dentro da casa dela.
Em busca por respostas, a família decidiu expor o caso nas redes sociais. Depois da pressão popular, o caso agora está sendo acompanhado pelo Ministério Público do Acre (MP-AC). Segundo o órgão, a família foi recebida no dia 25 de novembro para receber apoio, por meio do Centro de Atendimento à Vítima (CAV), e discutir os desdobramentos das investigações.
Caso Joyce: g1 mostra suspeito de violência psicológica e patrimonial contra mulher no AC
Audiência pública
Em junho deste ano, uma audiência pública discutiu a alarmante situação dos feminicídios no Acre reunindo parlamentares e autoridades na Assembleia Legislativa do Acre (Aleac). A reunião utilizou como base a repercussão do Caso Joyce.
O encontro, convocado pela deputada estadual Michelle Melo (PDT), tratou de possíveis medidas de enfrentamento ao assassinato de mulheres em decorrência do gênero e também ao chamado estelionato emocional, abuso psicológico e outras consequências.
Durante a audiência pública, Jaqueline relembrou que o caso da irmã não entrou para as estatísticas de feminicídio, o que é questionado pela família, devido às circunstâncias do caso. Ainda segundo ela, sua participação no encontro visou trazer o contexto de que os relacionamentos abusivos podem ter nuances além das que costumam ser discutidas.
“Esse é um dos maiores pontos do debate. É a gente dar nome a esse crime que aconteceu. A Joyce está dentro da estatística de suicídio. Nós vamos debater qual foi o crime que se encaixa para o caso dela. Eu trouxe um material bem robusto, um material para observação para sensibilizar as instituições, tanto homens quanto mulheres da cultura que nós vivemos, de um caso que é secular. Muitas e muitas mulheres morrem nessas mesmas circunstâncias, esse tipo de relação entre agressor e vítima”, destacou.
Thiago Augusto Sampaio Borges tem 43 anos, é mineiro e acusado pela família da acreana Joyce Sousa
Cedida ao g1
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